O plenário do Senado Federal aprovou pouco antes da meia-noite desta terça-feira (20) o decreto do presidente da República, Michel Temer, que impõe intervenção do governo federal na área de segurança pública do estado do Rio de Janeiro. Foram 55 votos a favor, 13 contrários e uma abstenção. A matéria será promulgada.

Aprovada na madrugada anterior pela Câmara dos Deputados, a medida iniciada em 16 de fevereiro tem agora o aval do Congresso Nacional para seguir até o último dia de 2018. Enquanto estiver em vigor, ficarão paralisadas as discussões e votação de qualquer proposta de emenda à Constituição (PEC) tanto na Câmara quanto no Senado. Essa é a primeira intervenção federal em um ente federado desde a promulgação da Constituição Federal em 1988. O ministro da Defesa, Raul Jungmann, estava presente no plenário do Senado durante os debates.

É a própria Constituição que determina que a intervenção federal é competência da União, só podendo ser decretada e executada pelo presidente da República. A norma máxima do país também dá poderes para o Congresso Nacional aprovar ou suspender a intervenção federal.

Senadores de partidos da oposição tentaram impedir a aprovação da medida, a qual classificaram de desnecessária, mal justificada, dispendiosa, mal planejada, politiqueira e eleitoreira. Afirmaram também que a intervenção foi decidida contra a vontade dos militares e que não resolverá os problemas do estado. Também foi criticada a possibilidade de uso de mandados de busca e apreensão coletivos, considerados inconstitucionais por vários senadores.

O Decreto 9.288/2018 foi aprovado por meio do Projeto de Decreto Legislativo (PDS) 4/2018, relatado em plenário pelo senador Eduardo Lopes (PRB-RJ). Em substituição à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), Lopes apresentou parecer favorável à aprovação do decreto, o qual considerou como medida extrema e excepcional, porém necessária diante da realidade do estado.

Segundo o relator, o estado do Rio de Janeiro enfrenta onda grave de violência e a população vive com medo e em “situação de paranoia”. Ele afirmou que a situação da segurança pública no estado atingiu tal patamar que exige medidas fortes e efetivas do poder central para garantir os direitos à vida, liberdade, igualdade, segurança e propriedade previstos pela Constituição a todos os brasileiros.

— A situação não é exclusiva do Rio de Janeiro, mas quando vemos bandidos assaltando carrinho de cachorro quente com fuzil, vemos que a situação é grave. A população vive assustada e com medo — disse o relator.

Eduardo Lopes explicou o inteiro teor do decreto presidencial e fez referência aos artigos constitucionais que regem o ato. Ele informou que, de acordo com o Decreto 9.288/2018, a intervenção se limita à área de segurança pública do estado e tem por objetivo extinguir o “grave comprometimento da ordem pública no Estado do Rio de Janeiro”.

O interventor nomeado pelo documento é o general Walter Souza Braga Netto. O decreto estabelece que esse cargo é de natureza militar. As atribuições governamentais fora da área de segurança pública permanecem nas mãos do governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, acrescentou Lopes.

Explicou ainda que o documento determina que o interventor é subordinado ao presidente da República e “não está sujeito às normas estaduais que conflitarem com as medidas necessárias à execução da intervenção”. Além disso, o interventor poderá requisitar “os recursos financeiros, tecnológicos, estruturais e humanos”, ligados à segurança pública e que sejam necessários para o objetivo da intervenção. O decreto também estabelece que o interventor poderá pedir auxílio de qualquer órgão da administração pública federal, civil ou militar.

A medida autoriza ainda que o interventor requisite “bens, serviços e servidores” das áreas das secretarias estaduais de Segurança e de Administração Penitenciária e do Corpo de Bombeiros Militar para emprego nas ações por ele determinadas. Também ficam subordinadas ao interventor as polícias civil, militar e penitenciária do estado.

O relatório favorável à aprovação do decreto foi apoiado em discursos pelos senadores Lasier Martins (PSD-RS), Magno Malta (PR-ES), Marta Suplicy (PT-SP), Lúcia Vânia (PSB-GO) e Cássio Cunha Lima (PSDB-PB). Falaram contrários à aprovação os senadores Roberto Requião (PMDB-PR), Gleisi Hoffmann (PT-PR), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Humberto Costa (PT-PE) e Lindbergh Farias (PT-RJ).

Lindbergh chegou a pedir questão de ordem para tentar parar a análise do decreto argumentando que o Executivo não apresentou cálculos dos impactos financeiros e orçamentários da intervenção. Mas o presidente do Senado, Eunício Oliveira, indeferiu o pedido do parlamentar. Lindbergh criticou o governo por não ter planejado de maneira eficaz a medida e de apresentá-la sem previsão de recursos e sem análise das repercussões financeiras.

— Como pode o presidente da República decretar intervenção sem os recursos necessários para que a medida seja conduzida? É uma jogada político-eleitoral de um governo acuado. Não há compromisso do governo Temer com a segurança pública. Temer cortou recursos da segurança pública de todo o país, inclusive no controle de fronteiras. O governo precisa dizer de onde vão sair esses recursos. É necessário um estudo de impacto financeiro — afirmou Lindbergh.

Por sua vez, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) comentou a nota técnica conjunta de procuradores federais que apontam equívocos no decreto presidencial. Segundo a nota, poderá haver graves violações à ordem constitucional e aos direitos humanos, como mandados coletivos de busca, apreensão e captura. Os procuradores também defendem que estabelecer o cargo de interventor como de natureza militar é inconstitucional.

Randolfe apresentou ainda requerimento pedindo a criação de uma comissão externa do Senado composta de dez senadores titulares e dez suplentes para acompanhar de perto a execução da intervenção federal. Eunício disse que o requerimento será votado futuramente.

O senador Renan Calheiros (PMDB-AL) classificou a intervenção de decorativa, simulacro e incompleta por não atingir o poder político do estado. Para Renan, a intervenção teria de atingir todo o governo, não apenas a área de segurança pública.

— É uma loucura, um tiro no pé, uma exposição desnecessária das Forças Armadas. Não acredito que o Senado da República se disponha a votar um decreto que descaracteriza a intervenção federal ao não apresentar as condições de sua execução. É uma intervenção meia-boca — disse Renan que, entretanto, declarou voto favorável ao decreto.

Os senadores Raimundo Lira (PMDB-PB), Jorge Viana (PT-AC), Paulo Bauer (PSDB-SC), Benedito de Lira (PP-AL), João Capiberibe (PSB-AP), Ronaldo Caiado (DEM-GO), Lídice da Mata (PSB-BA), Omar Aziz (PSD-AM), Armando Monteiro (PTB-PE), José Medeiros (Pode-MT), Pedro Chaves (PSC-MS), Hélio José (Pros-DF), Pastor Bel (PRTB-MA), Romero Jucá (PMDB-RR) e outros também falaram durante as orientações de voto para as bancadas partidárias.

Na Câmara

Quando da aprovação do decreto na Câmara dos Deputados, a relatora, deputada Laura Carneiro (PMDB-RJ), incluiu duas sugestões ao Poder Executivo em seu parecer. Ela pediu que o governo federal apresente recursos federais em caráter continuado, a serem usados na segurança pública e nas áreas de assistência social.

A deputada também sugere que o Poder Executivo regulamente o poder de polícia das Forças Armadas e estabeleça diálogos com o Ministério Público e com o Judiciário para o controle externo da operação. Os dois pedidos foram feitos na forma de indicação, que são opinativos e não vinculam a atuação do Executivo federal, já que não é possível apresentar emendas ao decreto de intervenção.


Fonte: Agência Senado